Especialista em Direito Imobiliário e Cível
Diretor da Comissão de Direito Imobiliário da OAB/MG
Diretor da Comissão de Direito Condominial da OAB/MG
Diretor da Associação Mineira dos Advogados do Direito Imobiliário - AMADI
Membro da Associação Nacional dos Advogados Condominialistas - ANACON
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Data15 março de 2021 DataMarcus Monteiro

ANIMAIS EM CONDOMÍNIO: LEI E BOM SENSO!
Não é de hoje que os animais, principalmente os cães, fazem parte do universo afetivo e do dia a dia de milhares de pessoas. Atualmente, os animais já não são considerados como "coisas", mas como seres sencientes, que experimentam, entre outras coisas, dor, alegria, tristeza e ansiedade. Dentro dessa perspectiva, inclusive, as pessoas já não são consideradas como "donas" dos animais, posto não serem eles "coisas", mas seus tutores.

Sem pretender aprofundar em questões de ordem sociológica ou filosófica, fato é que os animais são importantes companhia para um número cada vez maior de pessoas, que os consideram verdadeiros "integrantes da família". Essa questão social, obviamente, reflete no cotidiano dos condomínios. É cada vez mais comum a presença de animais de estimação em apartamentos, principalmente cachorros.

Normalmente, quando se fala em animais de estimação como peixes, pássaros e até mesmo gatos, não se costuma registrar maiores problemas nos condomínios. O mesmo, infelizmente, já não se pode dizer dos nossos queridos amigos caninos que, algumas vezes, viram foco de desavenças, principalmente em razão do volume e constância do seu latido.

Por ser, de fato, muito comum a presença de cachorros em apartamentos, a maioria dos condomínios e de suas convenções não apresentam impedimento à presença dos animais. Todavia, existem condomínios onde a convenção e o regimento interno proíbem suas presenças. Ocorre que referidas regras proibitivas são indevidas e afrontam a Lei, não sendo acolhidas pelo Poder Judiciário.

CONVENÇÃO, REGIMENTO INTERNO OU SÍNDICO NÃO PODEM PROIBIR ANIMAIS

O entendimento pacificado no Poder Judiciário é o de que as convenções condominiais e/ou os regimentos internos não podem proibir o morador de possuir um animal de estimação. A uma pelo fato do Poder Judiciário também compartilhar da visão sociológica, de costumes, sobre o tema. A duas, em razão da observância ao direito de propriedade. O Código Civil, em seu artigo 1.228, garante ao proprietário o direito de usar e gozar de seu bem.

Já a Lei 4.591/64, em seu artigo 19, garante ao condômino o direito de usar e usufruir de sua unidade de acordo com suas conveniências e interesses: "Lei 4.591/64 Art. 19. Cada condômino tem o direito de usar e fruir, com exclusividade, de sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e interesses, condicionados, umas e outros às normas de boa vizinhança, e poderá usar as partes e coisas comuns de maneira a não causar dano ou incômodo aos demais condôminos e moradores, nem obstáculo ou embaraço ao bom uso das mesmas partes por todos".

Assim, nem a convenção e o regimento interno, e muito menos o síndico por sua própria vontade, podem proibir o morador de ter um animal de estimação. Ainda que exista regra na convenção ou no regimento interno proibindo a presença de animais no condomínio,. tal regra é ilegal e sem validade, posto que contraria o Código Civil, a Lei 4.591/64 e a própria Constituição Federal, que garante a todos o direito de propriedade e seu livre exercício. Obviamente uma convenção condominial ou um regimento interno não podem confrontar e prevalecer sobre as Leis.

DO BOM SENSO E DO DIREITO AO SOSSEGO

Em todas as situações há de se levar sempre em conta o velho brocardo que diz que "o direito de uma pessoas termina quando começa o da outra.....". O próprio citado artigo 19 da Lei 4.591/64, que garante o direito do condômino de usar e fruir da sua unidade, é claro ao ressaltar que o condômino não poderá "causar dano ou incômodo aos demais condôminos ou moradores" .

O Código Civil também coíbe que a propriedade seja utilizada de forma a prejudicar o sossego, a segurança e a saúde da coletividade. Inclusive, por meio de seu artigo 1.277, garante o direito do morador de fazer cessar o incômodo ou o risco: "Código Civil. Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha".

O que deve prevalecer, sempre, é o bom senso e o respeito ao direito de vizinhança. Não ´é razoável que o tutor do animal deixe, por exemplo, que seu cachorro fique latindo a noite inteira, prejudicando o sono e o descanso dos vizinhos. Ou que permita que o cachorro fique trancado e sozinho, latindo o dia inteiro, prejudicando o sossego, os estudos e o trabalho dos demais moradores. Ou, ainda, que tenha o desleixo de permitir que seu animal circule sujando os corredores, hall e outras áreas comuns do condomínio, ou que fique solto incomodando e até mesmo ameaçando a integridade física de outras pessoas.

Assim, em que pese o direito do morador em ter um animal de estimação, caso este animal não seja devidamente cuidado e passe realmente (de forma justificada e provada) a incomodar outras pessoas, prejudicando o sossego e pondo em risco a saúde e segurança, medidas poderão ser tomadas tanto administrativamente pelo condomínio (notificação e aplicação de multas), como na esfera judicial pelo condomínio ou pelo morador que se sentir prejudicado (o Poder Judiciário poderá decidir pela retirada do animal que esteja afetando o sossego, a saúde e a segurança da coletividade).

Por fim, duas últimas questões merecem ser esclarecidas em relação aos cachorros nos condomínios: 1ª- Não é válida regras que autorizem a presença de cachorros de pequeno porte (raças menores) e proíbam a presença de cachorros de raças maiores. Às vezes, um cão de raça menor pode incomodar muito mais do que um de uma raça maior. A questão não é o tamanho da raça, mas se o animal causa ou não incômodo ou risco à segurança física e à saúde dos demais moradores. 2ª - Nenhum morador pode ser obrigado a carregar seu cão no colo, o que constitui ato vexatório, passível de indenização. Cláusula condominial neste sentido é abusiva e inválida. O animal pode transitar pelo chão, corredores, entrada social, elevador etc. Obviamente, o tutor deverá tomar os cuidados com a segurança física dos demais moradores, bem como evitar que o animal deixe sujeira nas áreas comuns.

Acima de tudo, é preciso bom senso e responsabilidade por parte de todos! Os donos, ou melhor, tutores dos animais, têm direitos e deveres. Têm direito a ter seu animal de estimação e a convenção/regimento interno não podem proibir. Todavia, quem quer ter um animal de estimação precisa ter um mínimo de tempo e condição para cuidar e não permitir que a coletividade seja incomodada. Conforme ressaltado, animais não são "coisas" e não podem ser tratados como tais. Merecem dos devidos respeito e cuidados!

Marcus Monteiro, advogado especialista em Direito Condominial e Imobiliário. OAB/MG 121.317. Tel./Whats.: (31) 99504-4541. E-mail: marcus@marcusmonteiro.adv.br. Blog: marcusmonteiro.adv.br. Insta e Face: marcusmonteiroadvogado.

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